Onde é possível brotar a poesia? Em canteiro de flores mimadas, regado de carinho diário, sem um pingo de carência? Em vasos de barro numa janela banhada de sol? Em lata reutilizada na parede sem reboco, derramando dinheiro-em-penca? Nas rachaduras abertas no cimento da calçada? Debaixo da aridez do asfalto que veste o corpo da cidade? Nas estradas a impor velocidade, a violência à espreita e a indiferença das paisagens a nos assistir passar? Em todos esses terrenos a poesia pode brotar. Até mesmo nos arremedos de frutas e flores de plástico em mesas de refeições incertas. A poesia, sendo arte, não admite preconceitos ou condicionantes. Ela brotará onde houver poeta que a possa acolher e cuidar.
Sendo arte, ela tem na liberdade um de seus faróis. Por isso mesmo não seriam limitações físicas, adoecimentos do corpo, da mente ou da alma a impedi-la brotar onde quer que seja. Luciana está atenta. Sua alma de poeta não dorme. Fica a vigiar o movimento de algum broto de poesia a se contorcer para romper a semente no lugar em que esteja, a qualquer tempo e hora do dia ou da noite, a nascer. Ali, esperando o pedido na mesa de um café, na sessão de terapia, sob ataque de raios e trovões em dias de furiosa tempestade, no quarto ocupado de ausências, de silêncios devastadores, sonhos desconexos de ruinas em construção, planetas escuros e solitários. Luciana recolhe uma a uma as mudas de seus devaneios, brotos nutridos de potência poética para as replantar no seu jardim nomeado “Pílulas de sentimentos”.
No jardim de Luciana, pode-se dizer das ilustrações de Olívia Viana, tão fortemente se ligam aos poemas, que são flores nascidas da mesma matéria sutil da arte de toda a plantação poética a que Luciana, agora, nos oferece para colher e fruir.
Marcelo Xavier
Publicitário, artista plástico autodidata, cenógrafo, figurinista, poeta e escritor
Pílulas de sentimento - Devaneios de uma bipolar
978-65-5079-306-7